Pra me pirraçar, Adelice pisou nos meus ramos de alecrim.
Eu tinha bem que uns vinte ramos no quintal, todos bem verdes, esperança pras manhãs de desgosto. Cheiravam feito mão de barbeiro, como dizem por essas bandas de cá.
Quando comecei a plantar, diziam de boca cheia que Alecrim não servia de nada. Eu, aficionado nos trejeitos dos temperos, já tinha aprendido que duas folhas de Alecrim faziam mais milagres que santo de igreja. Não tinha aperto que me fizesse desandar um bom prato.
O problema é: Adelice tem crédito comigo. Quando menino, aprendi com ela a mais valiosa das dicas: refogar, refogar bem pra coisa funcionar. Tempero gosta é de se juntar um com outro e fazer uma festa na panela.
Coisa foi que me juntei com Adelice. Tempero dos bons, nós dois.
Na hora do paladar, encontrávamos as nossas almas e eu nunca errei a mão. Adelice dizia: enquanto você mantiver essa mão certeira, sei que a coisa entre nós está andando.
Aí hoje, manhã de terça-feira, diazinho comum de tudo, ao provar um salmão com alcaparras que fiz, Adelice levantou a cabeça e, mastigando o peixe como se mastigasse pedra, lançou um olhar lancinante na minha direção.
Empurrou a cadeira com as costas, desandou a chorar e correu pra o quintal. Quando vi que pisava nos meus pés de alecrim percebi que o tempero tinha desandado.
Carmezim escreve às quartas-feiras
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