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Assim como depois de amar você nunca mais consegue dormir tranquilamente no meio da cama de casal, é difícil encarar a chegada para morar temporariamente em outra cidade como turismo depois que você já experimentou a sensação de construir uma casa.

Em Londres, as pessoas rapidamente se dividem em regiões de preferência. O leste é mais modernoso, o oeste é mais fino. O norte é distante e o sul é a terra nebulosa dos imigrantes, o possível leste de amanhã. Ao mesmo tempo, todo mundo já morou um tempo em quase todas as regiões. É uma dessas cidades – sabemos bem como elas são – que  nos joga de um canto a outro, nos chama de lagartixa, e nós amamos.

Fui jogada em Bayswater assim que cheguei, o que foi um bônus, porque o importante é começar pelo que você já sabe. Aqui é o Hyde Park, ali perto o metrô, depois daqui Notting Hill, acolá a estação de Paddington, ali perto o hotel onde fiquei hospedada com meus pais em 1996.

Bayswater é um dos bairros do oeste de Londres que fica perto de tudo o que é rico e turístico. Há poucos negros e árabes nas ruas, no máximo uns gregos donos de restaurantes aqui e ali. É um bairro de pequenos parques a cada dois quarteirões e de apartamentos vitorianos por fora e modernos por dentro, onde as pessoas tem janelas  suficientemente lindas para que não se queira fazer mais nada o dia inteiro além de ficar encostada nelas.

No catálogo dos meus reconhecimentos, é o bairro que aparece no telefone que Hitchcock usou em “Disque M para Matar” e, aparentemente, onde se passaram alguns outros filmes seus. “Frenesi”, por exemplo, foi filmado no antigo Coburg Hotel, hoje o Hilton Hyde Park.

É também perto do meu trabalho, com uma baldeação da District para a Central Line. E meu trabalho, por sua vez, fica em Oxford Circus, que é perto de Picadilly, que é perto de  Savile Row, onde os Beatles fizeram seu último show, no teto da Apple. O que já sei, onde já pisei, o que já fiz. O importante, para minha nova personalidade de dona de casa, era reconhecer.

Andava nos caminhos já trilhados quando fui visitar um apartamento para alugar em Brixton – o oposto do que me era familiar  – e experimentei outro tipo de reconhecimento, que é aquele que diz “é aqui que eu quero estar”.

Brixton é um bairro “com reputação”, como se diz aqui. Reputação, para os ingleses, quer dizer má fama. Até alguns anos atrás, Brixton era onde “The Wire” seria filmado, se fosse feito deste lado do Atlântico. É também onde Hitchcock veio filmar algumas cenas de “O Homem Que Sabia Demais” fingindo que estava em uma igreja em Bayswater. No oeste, ele sentiu falta do clima “perigoso” que queria para acentuar o barril em que se encontrava Doris Day.

Mas Brixton também é um bairro em processo gradual e suave de hipsterização. As casas vitorianas daqui são mais caídas, mas tem seu charme, o mercado já está cheio de restaurantes moderninhos/rústicos e – claro – algumas lojas de cupcake. É aqui que estão os caribenhos, os jamaicanos, as festas de Ska e o Ritzy . Brixton tem uma moeda própria, o Brixton pound, parte de uma tentativa de manter o dinheiro dos moradores na comunidade. Na nota de 10 Brixton pounds está David Bowie – outro filho do bairro – vestido de Alladin Sane.

Tá bom, Londres. Você venceu.

Camilla Costa passa a escrever aos sábados a partir desta semana.

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