Nobre leitor, não se apresse em recorrer à folhinha. Não imagine devaneios como saltos temporais nem questione se hibernou 48 horas sem perceber. Sim, hoje é quinta-feira e minha coluna [crônica?] está publicada neste virtual espaço entre o céu e a terra. Assim o será, e nem Deus sabe até quando.

Questão de acomodação interna para ajustar os fusos desta redação itinerante. Nada contra o sábado ressaqueado, os textos impregnados com o bafo alcoolizado da noite de sexta e as mãos trêmulas sempre a entregar o alfarrábio nas primeiras horas sabatinas. A vantagem da rotina é essa, você se acostuma com um argueiro a lhe furar o olho e até sente falta quando uma brisa delicada põe fim ao infortúnio.

Quintas-feiras também podem ser de ressaca. Se não alcoólica, moral – depende do quanto de vergonha teu time passou na quarta do futebol. Eu prefiro combiná-las. Preservo a quarta para uma boa taça de vinho ou gin tônica, o melhor custo-beneficio, em um ritual de expiação aos pecados do fim de semana passado e preparação às traquinagens daquele que se avizinha. Na verdade, e admito com um pouco de rubor na  face, estou sempre a achar pretextos para me envenenar com álcool. E garanto ter bons motivos para isso.

Nestes tempos de olimpíada, me sinto mais mortal do que nunca. Percebo que a única chance que teria para ascender ao patamar dos semideuses atletas seria se o COI instituísse o “halterocopismo” como modalidade competitiva. E só teria chance de medalha graças à aposentadoria forçada, e lamuriosa, do cartunista Jaguar.

Essa aposentadoria encerra de vez um dos sonhos juvenis que mais me acalentou. O de ter uma oportunidade de em qualquer tarde ensolarada tomar alguns choppes na companhia do próprio Jaguar e do já desencarnado Fausto Wolff. Aliás, sempre desejei não autógrafos, ou abraços e lembranças, mas sim a chance de sentar em um boteco com aqueles que admiro, falar amenidades, beber e cantarolar, jogar palitinho e contar piadas. Uma vontade de me sentir, minusculamente, parte de um universo comum.

O álcool me propiciou alguns poucos – e inesquecíveis – momentos destes. Arranhar meu portunhol com Manu Chao, derrubar Jair Rodrigues no backstage, invadir a convenção do PV com amigos e me aproximar de Gilberto Gil, ver a cara ébria de Zuenir Ventura ao lado do tímido Luis Fernando Veríssimo, mas principalmente me permitiu conhecer grandes amigos e grandes figuras.

Talvez por isso tenha criado certo bloqueio com pessoas abstêmias. Se o sujeito recusa um copinho de cerveja, uma dose de cachaça ou uma taça de vinho perde toda a empatia que um dia eu poderia nutrir por sua pessoa. Ora, que tipo de gente se nega ao sagrado direito de entorpecer-se lentamente até sentir sua pele coberta por um envernizamento anestésico?  Não se trata de ficar mais extrovertido ou atirado – há quem fique mais sisudo – de sair de si, mas justamente de, através da submersão etílica atingir outro nível de percepção sensorial, algo que só aos bêbados e os loucos é permitido.

Nas mesas dos bares, nos balcões da vida, discutem-se as grandes verdades e mistérios deste universo –  e de outros.

E se um dia eu forçosamente parar de beber como Jaguar, tornarei minhas as palavras dele: “O problema não é deixar o álcool, é o álcool me deixar”.

Enquanto esse dia não chega, brindemos. Saúde.

Alex Rolim é o novo titular das quintas-feiras. Ele substitui Camilla Costa, que passa a publicar aos sábados