Felipe tem cinco anos, os olhos iguais a duas bolinhas de gude de um cinza fosco e as mãos mais rápidas e curiosas do mundo.
Pergunta, pergunta e pergunta, e assim, e com auxílio das mãozinhas e da criatividade, vai construindo seu universo particular.
– Tio, você machucou o joelho quando era criança? – quer saber o pequeno.
– Não, eu machuquei jogando bola, faz só um mês – respondo.
– E dói?
– Agora não, porque meu joelho está imobilizado.
– O que é i-mo-bi-li-za-do?
– O médico colocou uma faixa para não doer.
– E como dói?
– Como? Não sei. Nunca pensei nisso. Acho que começa no joelho e sobre para a cabeça.
Ele pede para conhecer a perna enfaixada. Com os dedinhos ágeis, toca o meu joelho, as muletas, e me mostra sua bengalinha dobrável. Além de ajudá-lo a andar, a peça de metal é um cavalo voador, uma varinha mágica e um instrumento musical.
– Felipe, você coloca a mão em tudo? – pergunto.
– Só não coloco a mão na faca.
– E no fogo, você coloca? O fogo machuca também.
– Mas você é adulto…
– Mas machuca adulto também.
– Mas tio, como você faz para cozinhar?
– Eu não cozinho. Não sei cozinhar…
Felipe ri intrigado e repergunta:
– Tio, tio, o que mais você não sabe fazer?
– Nossa, Felipe, tanta coisa. Tanta coisa…
Mesmo acostumada a (tentar) responder as perguntas mais difíceis do mundo, a mãe do pequeno ainda se encanta com a destreza do filho.
– Filho, agora pergunta o que ele sabe fazer, né!
Faz pouco mais de quatro anos que ela e o marido conheceram Felipe, que veio com aquele par de mãozinhas curiosas e começou a tocar o rosto deles, a apalpar a barba de algodão do pai. Nessa época ele ainda não falava, mas já perguntava com as mãos e começava a aprender a ‘enxergar’ por meio delas.
– Felipe, chegamos, diz tchau para o Ricardo – diz a mãe.
– Tchau, tio. Tudo de bom pra você!
– Tchau Felipe, se cuida.
O menino vai embora. Vai embora, mas deixa, por onde passa, um pouquinho da curiosidade que tem de sobra. Vai e me deixa cheio de dúvidas e com aquela pergunta rondando minha cabeça.
Há muita coisa que eu não sei fazer. Muita coisa, Felipe.
Ricardo Viel escreve às segundas
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