Quando eu era jornalista, sentia que o tempo entre tomar conhecimento de algo, transcrever isso e publicar era insuficiente para aprender, reter alguma coisa.

Assim toda espécie de pessoa diferente, de lugar novo, de frase iluminadora que eu presenciava partia para dar lugar a outras que, impostas pela rotina, não demoravam de chegar.

O jornalista dá uma narrativa às coisas, ao mundo, mas garanto que aquilo que sai no jornal é bem menos do que o todo. O todo aliás é inatingível, mas o que a gente vê é bem mais do que o que a gente escreve. E não estou falando de extensão, de espaço: estou falando mais de profundidade, de uma quarta dimensão, do tempo.

Quantas vezes não cheguei à porta de uma casa bem pobre feita em um bairro que quase nem se considerava mais cidade, de tão distante que ele era, e de dentro da casa saía uma pessoa que era igual àquela que a gente vê dirigindo o ônibus, ou servindo na lanchonete, ou cortando coco na praia, e assim que ela, a pessoa, saía, havia uma transformação? A pessoa ganhava uma narrativa.

A pessoa não era mais o ambulante, o motorista, o garçom. A pessoa tinha nome, família e gosto. A pessoa tinha amigos. Tinha sentido.

Mas logo isso passava porque a gente tinha de voltar, tinha de transformá-la em texto, tinha de reduzi-la a sua frase em respeito ao contexto. E se não há nada de errado nisso, há algo de triste.

Cansei de virar as costas para o profundo e quis virar professor.

Mas a primeira coisa que veio foi o risco: e se eu virar apenas um que emparelha teorias e fatos na esperança da descoberta, mas cuja função é apenas devolver o que aprende, tal e qual, a um grupo de alunos que esta ali, justamente, para isso?!

Percebi que é mais fácil conhecer filosofias, hermenêuticas e exegeses do que acrescentar um ponto parágrafo no mundo.

Não porque demos importância indevida ao que fazemos – jornalismo, universidade –, mas porque às vezes fazemos do jeito que fazemos. Do jeito que esta previsto em contrato.

Não quero morrer sem a experiência do mundo, que artistas, poetas e filósofos alcançam. A experiência material.

Decidi ser marceneiro.

*Diego Damasceno é o convidado especial desta quarta