You are currently browsing the daily archive for abril 13, 2011 7:00 am.

Se derrubasse aquela, acabava tudo. E ela descansava bem na boca, pedinte, ciente da morte quase certa. O taco, o giz, a mão aberta e semi-suspensa sobre o pano verde, os olhos compridos da plateia – Lombo Frito, Caruara e Deixa Uma. Como não tremer?

- Aí não tem efeito certo, camarado. Bateu na cara, caiu. A mesa não tá empenada nem nada, o taco tá com a cabeça, todo cheio de giz, só não mata se não quiser.

Caruara entendia do jogo, mas tava mesmo era fazendo pressão. Aquela pressão do contrário, de dizer “tá fácil, fácil” e criar clima, boicotar a consciência do outro. Atirar pra ver se pegava, sabe como é? Caruara era sabido. A partida tava quase perdida pra ele, ele esparramado no banquinho, um copo de café fumegando do lado, na outra ponta um copo de cachaça. Nunca entendi como nunca estoporou com essa mistura.

– Cala a boca, Caruara, que se eu errar por causa da sua ladainha desço esse taco todinho em você, nessa sua fuça inchada de cachaça.

O suor descia pela testa e também já atrapalhava o deslizar do taco. Transpirou na mão, já era. O taco não escorrega. Eu sabia. Suspendi a mão da mesa.

– Ihhhhh. Vai amarelar, Tobia? (Deixa Uma comia o “s” do meu nome). Bola boa dessa, rapá! Só num leva o bolo se não quiser. O bolo tá aqui, ó, amarradinho na borracha, só na espera…

Quanto tava mesmo a partida?

– Pra quê cê quer saber, Tobia? Só precisa saber que se você matar, já era. Caixão e vela preta.

O dono do Espanta (sempre gostei do nome do bar) colocou uma musiquinha fajuta e disse que era em minha homenagem. Falava de falta de amor. Eu querendo me concentrar e ele vem com uma de falta de amor. Sabia que doía em mim, todos ali sabiam. Quando eu demorava muito assim na jogada, quando ficava titubeando, não tava com a alma centrada. Na verdade, acho que a alma tava fora de mim. E aquela maldita bola! E aquela música fajuta!

– Tobias tá numa de mal de amor mesmo. Nunca vi demorar assim.

Era a vez de Lombo Frito me sacanear.

Fiz que ia, suspirei, curvei o corpo sobre a mesa, a música entrou no refrão. Repetido por demais. E eu repetia por demais também o movimento do taco, deslizando sobre a mão. Segurei no terceiro anel do fundo do taco, estiquei bem o braço. Se era dor de amor, que me ajudasse a encaçapar.

Bola dentro.

Com o bolo amarrado na borracha dava pra manter a noite de aposta. E esperar pra ver se a dor ficava mais leve.

*Carmezim escreve às quartas

Junte-se a 172 outros assinantes

Textos deste mês

Arquivo

%d blogueiros gostam disto: