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De todos os espécimes da taxonomia humana, um quiçá permanecerá como uma fonte inesgotável de assombro para os futuros cientistas: o condômino.
De um arquivo empoeirado, irão retirar imagens, atas de reuniões, avisos pregados em elevadores e bilhetes de fim de ano. Eles se debruçarão intrigados sobre questões como a convivência entre grupos de condôminos, a interferência do ambiente em suas relações, seus rituais de reconhecimento, avaliação e cumprimentos (ou a falta deles).
Regras como a cobrança extra pelo uso de espaços cuja manutenção – constará nas atas – já era paga mensalmente e a proibição de guardar bicicletas na garagem dos prédios serão tema de debates, na tentativa de compreender as intricadas regras pelas quais navegava a espécie.
Na foto tirada por um pesquisador camuflado, o condômino aparecerá sentado, complacente, na companhia de seus pares, na piscina do prédio. Eles não usam roupas de banho, um sinal dos tempos. Não era permitido entrar na piscina.
Após tentativas extenuantes de classificar os condôminos em diferentes ordens, filos, classes sociais e níveis culturais, os cientistas talvez fossem forçados a admitir que o mistério possa ter uma solução simples.
A raiz das contradições na psique do condômino – que o fizeram escolher a partilha da vida privada e, ao mesmo tempo, cercá-la de muros contra a liberdade alheia – poderia estar simplesmente em sua insatisfação.
Talvez o condômino, com seu olhar baixo no elevador e sua indignação diante do uso indiscriminado da piscina, estivesse preso em uma realidade evolutiva com a qual não se sentia confortável.
Ao chegar a esta conclusão – não tão brilhante, mas satisfatória – os cientistas abandonariam a espécie até que novos acadêmicos, cheios de idéias sobre o passado, voltassem a demonstrar interesse nela.
Mas antes, eles remanejariam sutilmente o condômino dentro da árvore da taxonomia humana na virada do milênio. Ele ficaria mais próximo de outra espécie intrigante, contraditória e emblemática: o motorista.
*Camilla Costa escreve às quintas