A verdade é que a princípio me pareceu uma ótima ideia. Era útil, prático e qualquer um poderia fazer uma mulher feliz com um punhado de moedas. Era só introduzi-las na máquina, escolher o número e, como num passe de mágica, uma flor brotaria em suas mãos.

Fiquei ali por alguns minutos admirando a parafernália exposta no corredor do aeroporto. Era uma estrutura de vidro, uma espécie de aquário em vertical, com quatro andares de flores, de diferentes tamanhos e cores, que giravam vagarosamente.  Meu interesse era muito mais pela máquina – novidade para mim – do que pelo conteúdo: não esperava por ninguém e não tinha para quem dar flores.

E eis que o senhor seco, com roupa de missa de domingo, se aproxima e passa a analisar a geringonça. Olha primeiro com curiosidade, mas logo faz cara de reprovação e começa a balançar a cabeça negativamente. Vai embora contrariado e me permite imaginar que pensa que o mundo, realmente, está perdido.

Volto a olhar a máquina e já não a vejo com a mesma simpatia de antes. O senhor dos suspensórios tem razão, penso eu: não se vende flores assim como se fossem latinhas de refrigerante. Comprar (e vender) flores requer um ritual, um código estrito e protocolar de conduta.

Pela cara do cliente, o florista já sabe se o carinho é para gente viva ou morta, se é por amor ou obrigação, conquista ou reconquista, chegada ou partida. A partir daí, adota a postura correta para cada situação. Faz cara de tristeza ou pesar, ou se deixa contaminar pela euforia ou esperança que emana do apaixonado que procura, dentre tantos vasos, o girassol mais bonito que se tem notícia.

Se for para entrega, promete que vai escolher a flor mais linda que por lá tiver. Pergunta se o cliente não quer escrever um cartão, recebe o dinheiro como quem diz “se pudesse, não lhe cobraria” e, no final, deseja um bom dia para os amorosos ou guarda silencio em respeito a dor do semelhante.

Se for um bom florista mesmo, dá um suspiro demorado, cheio de inveja (da boa) ou de pena, pelo cliente que acaba de sair com um arranjo na mão, e pensa: nasci para vender flores.

Enquanto isso, a máquina apenas cospe um vasinho sem graça e, no máximo, diz: retire o produto.

O painel me avisa que chegou a minha hora de ir. Dou as costas para a florista sem alma e cruzo novamente com o senhor dos suspensórios. Cada um segue seu caminho, ambos com cara de quem já não acredita na melhora do mundo.

Ricardo Viel escreve às segundas