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O paranaense Hélio Leites é um desses artistas meio doidos e cheio de aforismos sobre a vida que a gente adora. Em um vídeo, que me foi enviado por uma amiga, ele discorre um pouco sobre o modo como trabalha e suas experiências. E conta o caso de um homem que se aproximou numa feira de artesanato, enquanto ele dizia que “quem está desempregado está procurando serviço no lugar errado”.

O homem, que coincidentemente estava desempregado, se aproximou dele e perguntou onde é, então, que se deve procurar emprego, ao que o artista respondeu: “Dentro da gente”. No vídeo, Hélio parece bastante consciente do valor de verdade – ou do valor poético, pelo menos – da sua resposta. Mas eu tive que discordar dele.

Primeiro porque, como todos provavelmente já sabemos, não é tão fácil conseguir ganhar um bom dinheiro com algo que se gosta de fazer. Boa parte das coisas das quais a gente sente que gosta, inclusive, parecem impossíveis de serem transformadas em algo rentável, pelo menos a princípio. Além disso, a ideia de que só não acha bom emprego quem quer pressupõe uma responsabilidade individual total e alguma desconexão com as circunstâncias do mundo.

Segundo porque, como eventualmente aprendemos, o nosso trabalho diário, ou aquele que fazemos para pagar as contas, não precisa ser aquilo que nos realiza completamente. Querer que o trabalho nos realize – ou o casamento, pela mesma lógica – costuma fazer com que qualquer frustração ou período de desmotivação pareça intolerável e mais trágico do que é na verdade.

No entanto, é importante que seu trabalho seja algo que você realmente goste de fazer. Hélio Leites diz, muito bem dito, que “pegar esse aparelho que pisca, que ri, que chora e botar ele pra trabalhar numa coisa que ele não gosta é um desserviço para o espírito”.

Mas tem um outro emprego, que talvez seja aquele ao qual o artista se refere, no fundo. Talvez ele queira dizer que o trabalho que pode realmente nos realizar, nos dar a sensação de ter encontrado a nossa função no mundo e na vida, esse sim, não aparece por aí, em qualquer página de classificados. Esse sim deve ser preciso buscar dentro da gente. Se é que ele existe para todos.

Se for mesmo isso, estou desempregada. Gosto do que faço e, hoje em dia, de como o faço, na maioria das vezes. É um bom emprego. Ótimo, até. Mas não sei qual é essa outra coisa de que gosto, à qual poderia me dedicar e fazer bem. Sinto que ela existe, mas não nos cruzamos ainda. Ou nos cruzamos e eu não percebi.

Encontro com outros amigos constantemente na fila do desemprego da alma. Estamos todos aí, procurando. Alguns esperando que o trabalho dos sonhos seja também o que consiga nos dar sustento, outros querendo que ele dê somente a satisfação da vontade bem empregada, das qualidades aproveitadas em algo que orgulhe.

De vez em quando um de nós se deprime um pouco mais. É porque o desemprego da alma tem dessas coisas. Mesmo que não nos faça passar fome, às vezes ele nos deixa em um certo aperto. Para continuar na minha metáfora brega, diria que é quando as contas do coração começam a ficar atrasadas.

Aqui, o vídeo de Hélio Leites.

Camilla Costa escreve às quintas-feiras.

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