Lara Priscila veio ao mundo com uma maldição. Tinha cabelo louro e liso. Por isso as meninas da sala de antemão desgostavam dela. E no recreio cochichavam que na verdade era quase marrom. E outra sempre dizia que a mãe era sarará, então nem podia ser assim tão bom na raiz.
Como não podia evitar ser bonita, ela andava desfilando, o que só complicava sua situação. Será que é tão difícil caminhar direito, é o que pensavam juntas, mas no fundo queriam mesmo era também ter peitos.
Lara Priscila morava numa casa miúda sem portão onde tudo parecia emprestado. Dava dó em quem tivesse coração. Elas sabiam, as meninas, porque às vezes quando tinha trabalho em grupo iam lá, se não houvesse outra maneira. Mas as visitas não serviam de compensação.
Ninguém sabe quando os rumores começaram, mas em pouco tempo todo mundo já repetia. Que Lara Priscila era uma piolhuda, uma piolhenta, uma piolha que estava empestiando a sala inteira. E de repente as cadeiras que ficavam em volta dela passaram a amanhecer vazias. E cada hora uma dizia se não tinha dinheiro pra comprar um shampoo, um pente fino, ou então que cortasse logo aquele cabelo.
Lara Priscila só chorava e quase gritava que não era nada disso. E podiam olhar sua cabeça se quisessem. Mas todo mundo só sabia se afastar com cara de nojo.
Numa manhã friorenta sua mãe apareceu na escola e pediu uma licença para a professora para falar com a turma. Que parassem com essa cureldade, porque sua filha não tinha piolho nenhum. Contou que todo dia ela chegava em casa e ia logo pedir pra que procurasse direito, separasse todos os fios e já estava com a cabeça quase ferida e talvez fosse até ficar louca. Disse outras coisas mais até que por fim fez cara de maldição.
Teve quem ficasse com pena, mas o que calou mesmo a sala foi medo, porque a pró falou que quem continuasse com aquela besteira ia ser suspenso.
Desde então Lara Priscila passava para comprar o lanche ainda mais rebolativa. Ah, este ciclo, a vida.
Tatiana Mendonça escreve às sextas
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