Só quero fazer uma pergunta: por que Anderson Silva é o nosso mais novo herói?
Que sociedade é essa que aceita admirar uma pessoa que promete quebrar todos os dentes da boca, bracos e pernas do adversário na modalidade de luta que pratica, garantindo ainda “violência nunca vista”, numa coletiva de imprensa? Por que ainda chamamos de jornalistas as pessoas que escrevem sustentando, promovendo, dando crédito e admirando essas declarações? Tratando inclusive o lutador por seu apelido, Spider?
Por que aceitamos debater que o MMA virasse esporte olímpico?
Além de um troglodita, Anderson Silva é também exemplo de como celebridades e jornalistas constroem, braços dados, o mais novo modelo de sucesso. Depois da luta (ele venceu), Anderson Silva convidou o adversário (diga-se, outro troglodita) para um churrasco. Em seguida, manchetes prontamente dão conta da hombridade do herói, que sabe ser generoso na vitória (que seja apenas nela, ninguém parece ligar).
Ficamos assim: o novo herói é especial porque machuca mais e sabe disfarçar a soberba e a humilhação do outro com declarações que se encaixam perfeitamente no espírito esportivo. O novo herói é célebre não só porque é famoso, mas porque não erra, não perde nem é infeliz. Na cultura das telas burras, já não basta ser perfeito, tem que gritar aos quatro ventos: “eu boto para fuder”.
Assim como Gretchen disse outro dia no reality show de que participa: “eu sempre serei a primeira que rebolou”.
(Como eu sei disso, se não assisto ao programa? Cartas à redação.)
Diego Damasceno escreve as terças
3 comentários
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julho 24, 2012 3:58 pm às 15:58
Daniel Cabral
A ascenção do MMA tem uma explicação muito mais rasteira, eu acho. Tem a ver com o fim de um esporte nacional alternativo ao Futebol (Formula 1 já era, vôlei é longo e complicado demais pra tv, outros esportes tem duração imprevisível demais e atrapalha a programação das novelas), com o poder da globo, e com o espaço deixado pelo ocaso do boxe.
MMA é narrado por Galvão Bueno, que só narra futebol (da seleção, hein) e fórmula 1. Não há prova maior do esforço da Globo pra fazer o MMA acontecer.
Ano passado teve personagem em novela das 8 que era lutador de MMA e tinha um bom (e doente) coração. Garantiu que mulheres achassem socialmente aceitável assistir lutas.
As ameaças antes das lutas, desafios, grosserias, são só uma repetição do que víamos no boxe dos tempos áureos. Muhammad Ali e Tyson falavam no mesmo nível. É só uma tentativa de recriar esses “mitos” de grandes guerreiros.
Em resumo: todo mundo queria lucrar com uma nova luta e rolou um pacto coletivo pra fazer do MMA um sucesso. Patrocinadores, Globo, organizadores das lutas, sites de esporte, TV’s a cabo, academias de luta, todo mundo queria.
A verdade é que empurraram esses “heróis” meio goela abaixo, e no meu íntimo acredito que ninguém leve a sério esses caras. O brasileiro não ama, de verdade, o Anderson Silva. A TV faz a gente acreditar que sim, só isso.
ISSO sim é deprê: papo vai, papo vem, internet pra cá, liberdade de escolha pra lá, nada adianta: uma emissora de TV, dois jornais e duas rádios ainda conseguem moldar a cultura e os hábitos brasileiros pra lucrar em cima.
julho 25, 2012 11:50 am às 11:50
Daniel Cabral
Aliás, falando em churrasco: http://youtu.be/yfnbreVJSnk
julho 27, 2012 8:00 pm às 20:00
Diego Damasceno
Nao sabia que ja rolava ameaças assim no boxe. Mas acho que hoje é diferente e pior.
Diferente porque boxe é um esporte muito mais técnico do que MMA (no boxe fica evidente um despreparado. No MMA esta cheio de despreparados).
E pior porque acho que vivemos um momento muito bizarro quanto à violência. Ontem morreram 11 pessoas em Salvador, assassinadas, so para dar uma idéia.
Não sei se a TV molda a cultura. Acho que ela se aproveita da empolgação para causar mais empolgação ainda e lucrar em cima, sem refletir sobre o tipo de valor que esta propagando.