Era o pai do meu pai, meu avô, e eu tinha o seu nome. Achava que era por isso que todo mundo aceitava que eu era o neto preferido, sem sentir muito ciúme. Só mais tarde entendi que não sentiam inveja do meu posto de predileto porque não ligavam de verdade para ele.

Era só o Véi Pêdo, o Véi Pedin, o Pêdo da Judite, que ganhou essa apelido porque quem mandava em casa era a mulher. Ela falava mais alto e ele, miúdo, quieto, quase um monge sertanejo, dizia:

– Deixa pra lá. Essa mulher é doida.

Deixou tanto pra lá que o deixaram também. Vivia em seu mundo, caminhava para cima e para baixo na cidade, ou subia e descia uma serra. Sempre com seu boné de vovô, seu tênis e o radinho de pilha embaixo do braço.

Uma vez levou um irmão da minha mãe e um grupo de amigos para subir uma serra. Ele gostava mesmo era de andar só e de pirraça levou todos para uma subida que os jovens não aguentaram. Lá de cima ele grita para os exaustos:

– Uh, matei!

Por vezes ele abria uma exceção para mim, e eu o seguia.

– Como vai, Seu Pêdo? – algum passante lhe peguntava.

– Vou por aí, doidão! – dizia cordial. Se eu queria saber quem era o tal ou a tal, ele respondia,

– Sei lá!

– Vovô Pedro, o senhor é engraçado.

– Desgraçado não! – e ríamos juntos.

Seus bolsos andavam sempre cheios de balas, que ele roubava no mercadinho do meu pai, e é por isso que as crianças das ruas por onde ele passava corriam aos montes ao seu lado, entendendo as mãos e pedindo a bênção. Antes de morrer, não deixou registrado nenhum grande feito, mas lembro das suas palavras finais. No hospital, minha mãe lhe fazia companhia e sem assunto lhe diz:

– Vida véia, né, Pedin?

– A vida é boa.

Pedro Fernandes é o convidado especial desta quinta-feira