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Se detesto de salas de espera? Não, depende da companhia. Um que esteve la comigo foi o escritor Italo Calvino.
E antes que me faça entender mal, não, eu não fui ao médico: foi em minha casa mesmo que se deu o encontro.
É que faço de Por que ler os clássicos a imagem de uma ante-sala literária, e termino desde já a métafora, porque sei que é pobre, apesar de eficiente.
Não só porque o livro é uma apresentação de livros que gostaremos de ler. Mas porque, também, o fato de ler o livro antecipa fantasticamente o prazer de ler os livros dos quais ele fala. Assim como o gemido do paciente anterior anuncia o que nos espera.
Enfim, é um livro do qual não gostaríamos de sair, nem que seja para conferir o que ele aponta, sugere, promete. Nunca o esquecerei.
Calvino escreve com prazer, o que suaviza a manifestação de sua erudição. Ele quer ser mesmo uma conexão, uma companhia provisória – diferentemente de Jorge Luis Borges que, nesse sentido (e apenas nesse sentido!) pode aborrecer em suas narrativas sobre outros livros que, talvez, não saiam de si mesmas.
Mas se há prazer em minha lembrança, há também uma certa decepção. Não com o livro. Nem com a vida. Talvez com o tempo. Não sei bem com o que.
É que fechando a contracapa, descobri, escrito na orelha, que Calvino havia desaparecido em 1985. Não chegou a ser um choque, mas um peso a mais, o que senti. Calvino morreu. O homem que escreveu aquele livro que tanto me impressionou, estava morto. Havia algo de perturbador nisso, algo que perturbava não o livro, finito, completo, mas justamente a relação que eu pude manter com ele.
Porque como leitor nunca perdi de vista que do outro lado da pagina, no fim de cada linha, havia um homem portando uma caneta e que dizia aquelas cosias.
Não se trata do desejo de um encontro, mas da confirmação de uma troca: o livro se basta, é vivo e tem a dizer, mas me interessa, também, que tenha sido feito por alguém.
Por quê?
Talvez me saber contemporâneo de alguém assim tornasse a vida mais sustentável, e o mundo, compreensível.
Ou talvez seja um dos caminhos da arte de se fazer apreciar. Talvez este: conectar duas pessoas através de um caminho de afetos e idéias.
Talvez a arte siga também por percursos estreitos, individuais. Não sei. Mas gostaria de poder perguntar a Calvino, saber o que ele acha.
Diego Damasceno escreve às terças