Houve um tempo em que se escreviam cartas. Eu mesmo o fiz. As minhas eram, sobretudo, dirigidas à minha avó. E sentar-se a escrever, revisar, colocar a mensagem em um envelope, levá-la ao Correio, e esperar durante semanas a resposta, tudo isso era um ritual que me agradava.

Digo isso porque recentemente li uma carta enviada por Jorge Amado a Zélia Gattai (publicada pela revista Bravo, veja aqui). Era 1948, ele estava exilado em Paris e ela estava no Brasil. É uma missiva cheia de carinho, doçura e bom-humor (com uma pitada de ironia). O escritor baiano conta um pouco de sua vida na Europa, das pessoas com quem convive, dos projetos e tenta acalmar os ciúmes da esposa, a ponto de escrever: “a senhora esta não me interessa em absoluto. Nem outra senhora qualquer. Interessa-me tu, meu bicharoco lindo e louco”. E também se declara: “Minhas saudades são cada vez maiores e não consigo gostar inteiramente das coisas porque não estás a meu lado.”

Fico a pensar em Jorge Amado escrevendo a Zélia. Todo o processo que era postar uma carta, todo o cuidado e angústia que significava, e toda a expectativa que gerava o envio de uma mensagem dessas.

Isso hoje já não existe. E não digo que o conforto dos e-mails seja ruim. Se posso escrever uma mensagem instantânea e gratuita, porque enviaria uma carta? Mas há, claro que há, uma diferença. Um e-mail é fugaz. Escrevê-lo demora uns quantos minutos. Muitas vezes sequer se revisa a mensagem. E se sabe que chegará, e chegará ao instante. E se se quer, consegue-se inclusive saber se a pessoa o leu (e quando).  Enfim, o tempo é outro.

Eu, o que tento fazer, é aplicar essa lógica do tempo de antes a alguns e-mails meus. Os que considero muito importantes, os guardo. E vez ou outra os (re)leio. Talvez para tentar entender quem era eu quando os escrevi. E há, também, e-mails que redigi e jamais enviei. Agora mesmo tenho um ali, na caixa de “rascunhos”, à espera de algo. Como uma carta de antigamente em que se duvida em enviar.  E gosto de lê-lo, e gosto da ideia de que posso enviá-lo quando quiser. E gosto, mais que nada, de pensar que um dia talvez ele se torne inútil, desnecessário, e então poderei apagá-lo para sempre, como quem rasga e depois queima uma carta.

Ricardo Viel escreve às segundas