Há certas coisas contra as quais não vale a pena se insurgir. A atitude melancólica diante da vida é uma delas. Invejo os que não a tem – porque é uma condenação -, mas já não luto contra.

Passei a aceitar que, nos momentos em que supostamente eu deveria, não sentirei a euforia que vejo nos outros. Falo mais especificamente de festas, celebrações e reuniões familiares. Nesses encontros, invariavelmente chega um momento em que me sinto só e que me pergunto por que não estou me divertindo como os demais.

Demorou, mas aos poucos fui me acostumando com a ideia de que não devo sentir-me culpado. E duas admiráveis companhias me ajudaram a entender isso.

Gabriel García Márquez, apaixonado pela música e bom bebedor, escreveu certa vez:

“Sou um dos seres mais solitários que conheço, e dos mais tristes, ainda que pareça incrível… As pessoas do Caribe são muito assim, ainda que tenham fama de todo o contrário, de gregários, de eufóricos, de festeiros, mas vocês os vê em plena festa e estão com uns olhos de melancolia”.

José Saramago, que essa fama de festeiro e boêmio não tinha, também era avesso a celebrações. Em seus Cadernos de Lanzarote fez uma linda declaração de amor a Pilar, mas o que me chama atenção nela é justamente sua introdução:

“As festas, em geral, põe-me melancólico. Mas no regresso dei por mim a dizer a Pilar: Se eu tivesse morrido aos 63 anos, antes de te conhecer, morreria muito mais velho do que serei quando chegar a minha hora.”

E Pilar, a mulher que fez Saramago rejuvenescer, contou que poucas vezes o viu desfrutar de uma festividade. Uma delas foi quando visitaram Salvador e, na casa dos Veloso, se reuniram com figuras como Jorge Amado e Zélia, Gil, Caetano e Dona Canô:

“Até José, pouco dado a reuniões grandes, que em situações como estas mais parece um cão perdido, esteve à vontade, descontraído, deixando correr o tempo, sem experimentar a terrível sensação de perda irreparável que tantas vezes, em ocasiões assim, se apodera dele.”

Enfim, isso de sentir-se sozinho tendo ao lado tanta gente, muitas vezes pessoas que quero muito e que gosto de ter por perto, não é coisa só minha. Há gente muito mais sábia que eu que nunca pôde resolver esse mistério.

Não há remédio, é preciso conviver em paz com isso.

Portanto, se um dia estivermos em uma festa e eu pedir licença para ir ao banheiro ou para encher meu copo, e você me vir minutos depois vagando perdido, não se preocupe: não é a festa, tampouco é você, a questão é comigo.

Ricardo Viel escreve às segundas