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Joana César espalhou centenas de inscrições estrangeiras pelos muros e viadutos do Rio de Janeiro. Podia ser uma missionária trazendo a salvação, uma bêbada desocupada, uma doida qualquer, e era só uma artista contando se estava feliz ou triste, explicando as razões de ter brigado com o pai ou descrevendo suas fantasias eróticas.  Os passantes viam, mas não entendiam o que representavam os sinais da linguagem cifrada que Joana inventou aos 12 anos, para esconder em seu diário que estava apaixonada por um amigo do irmão mais velho.

Quando cresceu, ela quis ser escritora, mas acabou destruindo todos os textos que produziu, para não ter que mostrá-los a ninguém. Faltava coragem. Acabou virando artista visual, mas costuma cobrir suas telas logo depois que as termina de pintar, e fica assim, fazendo e desfazendo até achar a obra suficientemente sumida. Por vezes, se sente que precisa, abandona o ateliê para anotar sua vida pelas ruas da cidade.

Soube dessa história lendo a piauí deste mês, que além de tentar explicar Joana, mostra como um jovem matemático, Paulo Orenstein, conseguiu fazer um programa que desvendou o código criado por ela. Seria o fim do mistério, mas Paulo, muito educado e por que não dizer humano, afirmou que não pretende publicar sua descoberta. Joana agradeceu.

Lembrei de mim aos 12 anos querendo tanto registrar meus dias numa agenda, para ter com quem contar, mas o pavor de ser descoberta me impediu e nunca nem comecei a tentar.  Também descartei a opção do código, porque todas as minhas amigas usavam um, e todo mundo acabava sabendo o que estava escrito lá, mesmo sem a ajuda de matemáticos enxeridos. Era já essa necessidade que eu tenho até hoje, tão burra, de me preservar.

Os sinais de Joana também me fizeram divagar sobre a vergonha que sinto de tudo que escrevo, principalmente aqui, e de como penso seriamente em apagar palavra por palavra logo depois que acho que terminei. Como se vê, não faço isso, talvez como uma espécie de auto-punição. O melhor seria se a precisão de dizer nem existisse. Mas aí eu talvez tivesse que renascer passarinho.

Tatiana Mendonça escreve às sextas

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