Mariano Rajoy conquistou a maior vitória eleitoral da democracia espanhola pós-ditadura franquista. Conseguiu maioria absoluta no Parlamento e não precisará fazer alianças para governar neste país de estrutura praticamente bipartidária – dos 350 deputados, só 54 serão de outros partidos que não PP e PSOE.

Mas o excelente resultado das urnas não garantirá a Rajoy autonomia de poder, como pode parecer. Acompanhada da Itália, a Espanha segue o caminho grego-português e se rende à cartilha dos organismos financeiros como FMI e Banco Central Europeu: arrochar para não contaminar.

As urnas deram a Rajoy o controle da política interna, mas os dias que sucederam a eleição do domingo passado foram marcados por recados claros e diretos da chanceler alemã Angela Merkel, principal líder europeia, e do mercado financeiro: as medidas de contenção e os cortes de investimentos têm que ser imediatos e efetivos.

Esse é o preço a pagar pelo direitista Rajoy, que deve sua eleição à profunda crise econômica que enterra o país num desemprego superior a 20% e que destroçou o governo socialista de José Luis Rodríguez Zapatero.

As ajudas econômicas do Estado de Bem Estar Social, que de certa maneira faz com que a crise não seja tão sentida nas ruas, estão profundamente ameaçadas. Para se ter uma ideia, cerca de 3,5 milhões do total de 5 milhões de desempregados recebem do governo central um seguro no valor de até 75% do seu antigo salário. O benefício pode ser dado durante até dois anos. E grande parcela dos outros um milhão e meio de parados ganham bolsas mais modestas dos estados.

Mas esse tipo de medida está claramente ameaçada. Rajoy fugiu do tema na campanha, ainda que incitado por seu adversário esquerdista Alfredo Pérez Rubalcaba, que mostrava contradições em seu discurso.

Está claro que os recortes serão feitos e sentidos.

Diante disso, as perspectivas sociais não são das melhores. O vizinho Portugal também trocou da esquerda para a direita, apertou o cinto e agora enfrenta aumento nos índices de violência e greves constantes. A mais recente, nesta semana, paralisou o transporte em todo o país.

Nota especial para Grécia e Itália. Os dois países tiraram seus governos legitimamente eleitos – pode-se questionar a moral de Berlusconi, mas não se discute sua eleição democrática –  e colocaram homens do banco de negócios Goldman Sachs, sediado em Wall Street.

Os mais radicais falam em “o golpe remodelado do século XXI”, aplicado pelo mercado.

Lucas Papademos, novo primeiro ministro grego, foi quem negociou com o Goldman Sachs, quando diretor do Banco Central da Grécia, a maquiagem da dívida do país que lhe garantiu a entrada na zona euro. A operação, no entanto, foi o que estourou a atual crise. Já Mario Monti, que substitui Berlusconi, é conselheiro internacional do banco desde 2005.

Como se não bastasse, o Sachs ainda tem o seu ex-vicepresidente Mario Dragni como o comandante do Banco Central Europeu, que, por sua vez, estabelece os parâmetros para o novo governo espanhol.

O Goldman Sachs é aquele mesmo que foi apontado como pivô da crise de 1994 no México.

E assim parte da Europa entra numa espiral comum à América Latina dos anos 90, quando os investimentos sociais eram escassos por conta da rezada cartilha do FMI e quando a AL ficou estagnada até mudar sua postura e fortalecer os Estados.

A experiência latina ensina e boa parte da população reage, mas, sem foco, não chega a criar empecilho para o novo perfil de poder a la latina traçado na Europa.

Vítor Rocha escreve aos sábados.