Falei anteontem sobre o movimento de ocupação da Reitoria da USP. É preciso voltar ao tema.
Antes de continuar, um pedido de desculpas pelo título. Troquei o respeito aos estudantes pelo trocadilho fácil.
De volta ao texto, escrevi-o porque achei que tinha começado mal a invasão (os argumentos nesse sentido estão la). E se começou mal, por parte dos estudantes, terminou pior, por parte do poder público.
O notório reitor, em seu notório saber, achou que tudo resolveria com um notório telefonema: notória preguiça, notório desrespeito à comunidade acadêmica e notória ignorância sobre o significado do espaço que administra – e não estou me referindo apenas à sala que ocupa – , bateu o fio para sua assessoria jurídica e encomendou um pedido de reintegração de posse do prédio.
Acho um tanto canalha o uso oportunista da história brasileira que se faz para justificar atos protagonizados por grupos. O movimento estudantil volta e meia recorre a isso: se contrariado em qualquer circunstância, prontamente evoca Ditadura Militar. Mas dessa vez acho difícil encontrar uma metáfora melhor. Difícil porque são vergonhosas demais – para a USP, para o estado de São Paulo, para o Brasil de 2011 – as fotos de estudantes saindo da reitoria com as mãos na cabeça, rendidos pela tropa de choque, como se criminosos perigosos fossem. A violência disso não está na presença ou na ausência de algemas, no uso ou não uso de cassetetes, cachorros, bombas de gás e balas. A violência é a presença de um grupo militar preparado para combate armado ser acionado para resolver uma crise de origem social e política.
Social porque a questão segurança no campus da USP, origem profunda da ocupação da reitoria e tema levianamente ignorado por mim no texto da terça passada, é um problema que nasce da segurança em São Paulo. O problema da segurança não é o problema da violência. São distintos, ainda que um passe pela outro.
E político porque, se é por uma situação mais ampla que a falta de segurança atinge a USP, é pela incapacidade de nossa classe política para lidar com o problema com imaginação e coragem que ela, a falta de segurança, permanece instalada. Não quero dizer que a culpa começa e termina nos políticos, e não em nós, que votamos, e que não passa pelos que não sabem votar. Quero apenas constatar: reitor, secretário de segurança, prefeito, governador, PSDB, PT não deram provas de estar preparados para lidar com o problema.
Ainda, se falei das fotos, é preciso falar também de quem as tirou. Escrevi o texto anterior baseando-me em informações que li nos noticiarios da Folha de S. Paulo e de O Estado de S. Paulo. No portal UOL, do grupo Folha, foram destacadas fotos de pichações e entulho na reitoria desocupada. E no Estado de S. Paulo, escreveu-se que os ocupantes eram “vândalos”. Ora, ninguém tem direito de agredir jornalista. Mas por que jornalista acha que tem direito a revidar por meio do que escreve, dos títulos que escolhe, das fotos que destaca e da omissão sobre o que realmente interessa – um debate aprofundado sobre a segurança nesses veículos, alguém viu?
Por fim, é também uma oportunidade para pensar sobre o tema da maconha. No Brasil é proibido fumar, portar, levar, trazer, plantar, vender, cantar música, fazer passeata relacionada a maconha. A lei brasileira finge que ela não existe – pior, decreta que ela não pode existir. É estúpido, até porque não se pode conversar sobre isso – o último politico governista que abriu a boca para falar sobre foi sumariamente demitido.
Enfim, é obvio que é preciso mudar nossa postura diante da droga. Mas não é fumando que vai se resolver a questão. Por isso, apesar de fruto de uma lei ultrapassada, de uma sociedade mal informada, de uma polícia que inverte prioridades tão absurdamente, acho que a polícia não errou ao levar os estudantes para a delegacia. É difícil não parecer legalista afirmando isso, mas é mais difícil ainda achar que quebrar uma lei pontualmente vai mudar o quadro todo.
Cercar viaturas foi um erro e uma provocação. Mas acho que está claro que o problema envolve discussoes bem mais amplas do que essa.
Diego Damasceno escreve às terças e, excepcionalmente, nesta quinta. Camilla Costa volta na semana que vem.
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