Se há uma coisa que não se sabia do outono era a urgência.
Talvez por causa da queda das folhas e dos tons terrosos, a estação parece sugerir um recolhimento imediato, tempo de entediar-se voluntariamente. Mas o verão cria tal estado ânimos que torna impossível recolher-se, e o outono se torna, por falta de melhor definição, uma corrida contra o tempo.
Por seu caráter de longo pôr-do-sol do verão, o outono não quer acabar. Sua melancolia tem a mesma origem daquela que nos diz, sentados diante da praia, que o dia (a juventude/a festa/a diversão) chegou mesmo ao fim, é hora de ir para casa (para o trabalho/para a vida adulta/para as responsabilidades) e deixá-lo para trás.
No hemisfério norte, a informação-chave para compreender o outono é a de que perdemos quatro minutos todos os dias. Nos trópicos não contamos a perda de luz, porque não a entendemos relevante. O dia será sempre o dia, um pouco mais, um pouco menos.
Aqui, a escuridão avança diariamente – dois minutos ao nascer do sol, dois no pôr-do-sol. Quando ela tiver se instalado, haverá somente cinco horas diárias de luz. Fosse a sua chegada repentina, o inverno poderia ser menos sofrido, passado o susto inicial, porque saberíamos que assim como chegou, de um salto iria embora.
Mas o avanço da sombra tem um efeito diferente – ele urge. O outono dá uma pressa crescente de viver o dia, de estar nas ruas, de aproveitar até a última fresta da porta aberta. Seja comendo fora algumas vezes mais ou comprando casacos ou reavaliando as prioridades ou andando sem rumo.
A mágoa de que ele nos roube o verão faz também que seja a única da estações a sofrer da maldição do esquecimento. Nas nossas memórias estão sempre “aquele verão incrível” ou “o inverno do ano tal, que foi bem frio” (chuvoso, a depender da sua parte do mundo) e a primavera, mimadíssima, beneficiada pelo fato de que sempre dá o presente, nunca o leva embora.
O outono, no entanto, aguarda o dia em que será lembrado como o período notável do ano, o momento em que o mundo físico esteve mais próximo, talvez, da natureza humana.
Nesse dia, ele sonha, haverá pelo menos um livro que comece com “Foi naquele outono, a poucas semanas da escuridão, que tudo aconteceu tão depressa”.
Camilla Costa escreve aos sábados e, excepcionalmente, em qualquer outro dia da semana que seja necessário.
3 comentários
Comments feed for this article
outubro 2, 2012 2:35 pm às 14:35
Livia Pacheco
Oi Camilla, engraçado, eu AMO o outono! Pra mim, o ideal seria uma primavera que descambasse diretamente para o outono, sem o chato do verão pra atrapalhar :-P Dito isso, concordo que esse ano o outono tá meio xoxo, a cidade tá ressacada, né? Beijos.
outubro 2, 2012 4:06 pm às 16:06
Camilla Costa
Ah, nem sei se tá exatamente xoxo! Mas a ressaca de Olimpíada tá braba, mesmo =P
outubro 3, 2012 2:33 pm às 14:33
Tatiana Mendonça
quero ler esse livro, camis.