Não vou ter os minuto a mais que você está me pedindo, não, tenho que deixar o embrulho logo logo, e num fique de conversinha muito, não, porque já tá me dando caruara no estômago só de ter que ficar cara a cara com Piolho, cê sacô?

Saquei, disse bem baixo. Aproveitei e dei uma lance de olho nas perna de Dá Vinte, cheia de cacau, como dizia uma coligado meu, cheia de mancha preta, umas coisa estranha,  meio nojento. Cê anda por aí queimando as perna com bituca de cigarro é Dá Vinte?

Depois me arrependi de ter perguntado. O malandro veio de lá azuado, derramou uma pá de palavrão, falou mais uma vez do embrulho, que Piolho tava esperando e o que é que importava a PORRA da perna dele? Assim mermo, PORRA, gritando pra rua toda ouvir.

O embrulho era uma caixa de papelão e dentro tinha uma besteira. Besteira, nada, a gente tinha que dizer que era segredo pra Dá Vinte não deixar a curiosidade de gato dele falar mais alto e meter as fuça no pacote. Se metesse as fuça e Piolho soubesse, bau bau.

Aí amarrei o pacote com o cordão de amarrar as encomenda da bomboniere, tipo bala aicequis, sete belo, pirulito que deixava a língua colorida, jujuba, Maria mole. Maria mole lembrava um amorzinho que tive uma vez mas que aqui não vem ao caso.

O caso é que Dá Vinte tinha que levar o pacote lá no final da rua e cê num sabe da maior, man. O pacote nem era pesado nem nada, mas era de responsa e eu tinha que dá a direta pra o cara: que todo cuidado era pouco, que não tivesse pressa, que Piolho tava tranqüilo.

Dá Vinte tremia e suava, quem diria que um armário daquele feito de carne e osso ia ficar amarelo daquele jeito pra levar um pacotinho pro Piolho. Mas o Piolho era o Piolho e era melhor ter medo, medo nunca era demais, né não?

O cara segurou o pacote com a palma da mão branca, colocou a outra mão por cima, jogou debaixo do suvaco, aí eu dei a idéia: man, tira essa porra de debaixo do suvaco porque se ficar fedido, Piolho dá de porrada em voc ê.

Assim meio mambembe de medo Dá Vinte subiu a rua. Maconheiro, traficante das outra pegada, mãe, pai, vizinho, todo mundo cagava de medo do Piolho, e eu tinha que ficar mandando encomenda pro cara e ele só queria que fosse o Dá Vinte pra levar.

Eu fiquei da porta da venda. Piolho nem era grande, imagine, também com um apelido desse, mas era que diziam as línguas da rua que ele sumia fácil depois de tirar sangue de alguém, olhe que viagem dos inferno?

Quando Dá Vinte chegou na porta, eu vi o braço do nanico do Piolho esticado e pegando o embrulho. Eu sentia a tremedeira de Dá Vinte daqui. Torci pra que não faltasse nada, como o encomendado. Vi o tapinha no rosto do entregador, hehe.

Dá Vinte voltou vivo e me disse somente que Piolho tinha agradecido e que da próxima vez eu mandasse mais pirulito. Porra, pensei, mais pirulito? E Dá Vinte só dizia não me mande mais lá não, miserável, não me mande mais lá, não, na moral.

Carmezim escreve às quartas-feiras