No cinema, as coisas são mostradas de um jeito para que outras sejam reveladas. Outras coisas a partir da coisa mostrada.
Mesmo que às vezes a bunda de Debora Secco seja apenas a bunda de Debora Secco – ou seja, mesmo que o que se queira revelar escape pouco do que é mostrado – , mesmo assim, há uma revelação. Pode inclusive ser apenas revelação da falta de compreensão do filme sobre si proprio, ou do diretor do filme sobre a relação entre o que se mostra e o que se vê. Um professor que tive dizia: “é preciso conhecer todos os tipos de imagem, vê-las para saber como elas são produzidas”. Dizia isso enquanto passava um documentario francamente ruim.

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Daí que o cinema ruim se encontra com o cinema bom – que é diferente do filme bom: o filme é uma forma; o cinema eu entendo aqui como atitude, postura diante do mundo, compreensão, descoberta.
Encontra-se também, com os dois, e sob esta perspectiva, o não-cinema. A imagem que não foi feita com intenção de se relacionar com o mundo, mas apenas de transportá-lo de um lugar a outro. Enfim, a imagem que só quer registrar, mas que, ainda assim, tem um poder de revelação.
Considero não-cinema o video acima. Por dois motivos. Primeiro, ele me mostra o mundo como registro (Caetano canta). Segundo, e é quando se torna não-cinema, porque, como imagem, ele faz algo que o mundo-em-si não faz: ele se repete.

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Caetano pode cantar a mesma música vinte vezes, mas será sempre um evento novo, jamais repetição. O video é imutável: é a reedição de um presente que já passou. Pois é essa reedição que me traz a revelação, a coisa além da coisa.
Que coisa é essa? É uma pergunta: o que faz um homem sentado com um violão cantando uma música que ele compôs? Uma pergunta de dois sentidos: qual a razão disso? Mas também: qual o significado disso?
A razão é nenhuma, e com isso a segunda pergunta me deixa ainda mais perplexo. Perplexo com o fato de que, um certo dia, certo homem resolveu sentar-se para cantar uma sua composição, como se isso não fosse nada – e não era. E, ao mesmo tempo, como se pudesse ser tanto – e é.

Diego Damasceno escreve às terças