Na Bahia, na verdade em Salvador, há uma gíria meio antiga que não sei se ainda usam. Quando alguma coisa parece mentirosa ou improvável se dizia automaticamente em tom jocoso que era “folclore”: “Que folclore (pronunciando-se fóclóre) é esse?”.
Hoje lembrei dessa gíria, depois de acordar de sonhos esquisitos, perceber que não tinha virado inseto e ter que resolver um problema kafkiano por telefone que a operadora de celular me criou. Caminhos ainda mais estranhos me levaram a passar a vista novamente sobre um link descoberto durante a semana, um mapa do folclore americano, criado em 1946 por William Gropper, reunindo personagens, bichos e episódios típicos de cada região.
Como quem frequenta as redes sociais deve, por força da obrigação, acreditar em pelo menos seis coisas impossíveis que lê na sua timeline antes do café da manhã, pareceu-me possível um mapa do folclore moderno brasileiro, mas aquele fóclóre como se diz em Salvador — não o tradicional, dos sacis e histórias míticas reais, mas aquele dos absurdos trágicos ou cômicos que nos contam todos os dias os jornais, os portais, as declarações.
Ele teria que incluir a presidente que escapa para passear de moto em Brasília; o hambúrguer de foie gras “servido em prato de porcelana” que custa (ou vale?) mais de 200 reais em São Paulo; o médico de renome que afirma que, justamente por ter uma obrigação com o paciente, não se deve corrigir possíveis erros de médicos estrangeiros em Minas Gerais. Os médicos nacionais, imagino, sequer precisam de correções.
No meu pequeno arroubo criativo, que já se desfaz chegando ao fim deste texto, pensei em chamar um ilustrador que fizesse comigo o tal mapa e convocar uma grande mobilização para reunir e selecionar os fóclóres que atualmente testam a nossa credulidade — um esforço que talvez fosse grande demais, já que seria preciso atualizar o tal mapa a cada dia. Já se vê que meu projeto não sairá do papel.
Fiz ainda um esforcinho, só para amparar essa crônica capenga, de buscar mais exemplos (pelo menos os da última semana!) mas são tantos fóclóres que, perdoem, já não consigo nas poucas horas que tenho acordada nessa manhã esquisita, que já é tarde.
Camilla Costa escreve aos sábados.
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