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Travei dia desses breve, porém acalorado, embate – que por sorte se restringiu ao uso de palavras e gestos – com moça bela mas, desconfio eu, de coração empedrado (ou mentirosa descarada). Dizia ela que nunca, jamais, havia sentido na vida ciúme; que não sabia o que era isso e não podia entender quando sobre o tema alguém discorria.
A celeuma se deu porque ela dizia isso olhando, com seu par de jabuticabas, nos meus olhos – rosto empedernido, desafiadora, quase irresponsável. Fazia seu discurso justo para mim! Eu, que tenho ciúmes de tudo.
E quando digo tudo é porque meus ciúmes vão muito além desse sentimento bobo e doentio que um namorado sente pela namorada e vice-versa. Esse, de tão banal e corriqueiro, nunca alimentei.
Meu ciúme é verdadeiro, profundo e justificado; o sinto por meus amigos, porque demorei muito para conquistá-los e para me deixar ser conquistado por eles. E por isso não os apresento a qualquer pessoa e em qualquer situação. E quando apresento, é porque sei que se entenderão, que criarão rápido e sincero apreço mútuo e que, com sorte, se tornarão amigos – o que provavelmente me gerará algum ciúme bom (sim, ele existe).
E meus ciúmes vão bem mais longe.
Tenho ciúmes de música, de livro, de poesia, de filme, de lugar… Quando descubro que gente besta descobriu e gostou do que descobri e gostei primeiro, fico encolerizado, mesmo. Eram meus, faziam parte da minha vida e os compartia parcimoniosamente com os poucos escolhidos, os que fizeram por merecer; e de repente chega um(a) desqualificado(a) e toma meu tesouro?
Expliquei-lhe meus motivos, expus minhas justas justificativas, mas ela, couraça em forma de gente (ou mentirosa contumaz), seguia com sua mirada infame e balançava a cabeça negativamente, fazendo voar seus cabelos castanhos levemente encaracolados e me desconcentrando da tarefa de tentar convencê-la.
Pois nada, azar o dela, que enquanto não ganhar minha confiança continuará sem conhecer as músicas, os filmes, os poemas e os amigos que eu mais quero, que esses eu levo bem guardadinhos e não os reparto com qualquer(a).
Mais fácil que a presenteie com meu coração – que esse vira e mexe me roubam, ou acabo por perdê-lo pelo caminho e tenho que construir outro – que com meus ciúmes. E tenho dito!
Ricardo Viel escreve às segundas