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Antes que ele se vá (em poucos dias ou em muitos anos), gostaria de dizer umas coisas. Até mesmo porque, quando ele se for, vamos ser inundados pelos obituários midiáticos de sempre: declarações (vale pela quantidade); galerias de foto; colunistas, um a um, e um após o outro, dizendo praticamente a mesma coisa; Sérgio Chapelin “estabelecendo a verdade dos fatos” com seu tom de voz definitivo; alguém finalmente tomando a providência de disponibilizar em DVD a maior parte (e não a menor, como está disponível atualmente) do que ele fez.
A primeira coisa é que é muito triste que um de seus melhores personagens, em suas últimas aparições, tenha sido rebaixado a um quadro num programa que só não é o mais idiota da televisão aberta porque pessoas como Bocão e Gugu ainda estão na ativa e porque, nesse mesmo programa, há humoristas cujo talento o próprio programa ofusca, mas não esconde por completo.
Este personagem bastaria para fazer a fama de um humorista: o nome – Bento Carneiro – , o título, os modos, o assistente medrosíssimo, o destino, tudo remonta a uma percepção finíssima do que é nosso país, suas aparições sendo sempre uma oportunidade de rir com inteligência de algo sério e pensar com seriedade em algo triste. E essa é a segunda coisa: Chico Anysio, em cada um dos seus personagens, mapeou, interpretou, tirou sarro e fez refletir sobre o Brasil. É de longe o maior humorista que temos. Até porque, além de incarnar seus personagens, os inventou: seus diálogos, roupas e bordões; criador, foi escritor, ator, roteirista e diretor de TV.
Bento Carneiro estar no Zorra Total é uma metáfora sem graça do destino que a televisão impôs a seu inventor. Não que a gente esperasse coisa melhor da Rede Globo, que sempre tentou destruir aqueles, trabalhando lá, não quiseram se submeter; nem é diferente no resto das outras grandes empresas de comunicação, para quem os verdadeiros gênios merecem o isolamento ou a chacota, vide o caso de João Gilberto.
Ao que parece, Chico Anysio tentou, nos últimos anos, ter um programa seu. A cultura da bunda nua no horário nobre não quis; a industria do vazio supremo em pay-per-view não deixou espaço na grade. O que ele ganhou foram imitações sequenciais de sua ultima criação, a Escolinha do Professor Raimundo (a atual tem Gugu Liberato no papel de professor), em que contracenava com gente do quilate de Grande Otelo (“Aqüi! Qüi qüeres?”), Zezé Macedo (Dona Bela), Costinha, Lucio Mauro, Mario Tupinamba (Bertoldo Brecha) Roni Cocegas (Galeão Cumbica), Francisco Milani, Castrinho, Jorge Loredo, Rogerio Cardoso (“captei!”)…
Esse texto contém bem pouco de tudo que eu gostaria de dizer sobre e para Chico Anysio; mas, ele nos deixando nos próximos dias ou ficando conosco mais algumas décadas, não é aqui que começa nem que termina minha homenagem.
Ela se estende desde o momento em que os quadros de seu melhor programa, Chico City, pararam de passar, até quando minha cabeça funcionar. Porque, desde então, uma das coisas que mais gosto de fazer com meus pais é relembrar os bordões, as figuras e os nomes que eles descobriram e me ensinaram a gostar: Bozó, Pantaleão Pereira Peixoto, Painho, Coalhada, Silva, Urubulino, Alberto Roberto, Popó, Nazareno, Azambuja, Justo Veríssimo… E rir um riso que a gente não encontra mais na televisão.
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Amostra infima e recente: http://www.youtube.com/watch?v=XsW6dNs6MUI
Diego Damasceno escreve às terças